quarta-feira, 3 de junho de 2015

O PREÇO DA OSTENTAÇÃO

Tradição?

Não me venham falar que a sopa da barbatana de tubarão é uma receita milenar que vovós chinesas vêm passando através de gerações na tentativa de manter vivos antigos costumes de seu povo. A sopa da barbatana de tubarão nada mais é do que símbolo de status e riqueza, pura ostentação que se vê em grandes eventos como casamentos, festas e jantares de negócios. Herança da Dinastia Ming - que a elevou a condição de iguaria pela raridade de seu principal ingrediente - a sopa atualmente é consumida em escala muito maior do há alguns séculos.
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(FOTO: Clarissa Ferreira / Barbatana de tubarão em vitrine de loja em Macau, China)

Um amigo brasileiro que também vive aqui em Cingapura me relatou outro dia sobre um jantar de confraternização da empresa onde ele trabalha, durante o qual foi servido o polêmico prato. Ele, que há anos ouve meus discursos sobre a sustentabilidade daquilo que levamos à mesa, recusou-se a experimentá-lo. Seus companheiros cingapurianos, no entanto, deliciaram-se com a iguaria sem culpa alguma. Não porque era gostoso. Não porque tinha propriedades medicinais. Mas porque era caro, chique e, para a sorte deles, de graça naquela ocasião.

Segundo o site Stop Shark Finning, um prato dessa sopa pode custar até 100 dólares nos restaurantes, o que faz com que pescadores espalhados pelo mundo não poupem esforços para garantir as tais barbatanas capazes de aumentar consideravelmente o lucro dos negócios. Não precisamos ir muito longe nessa história para concluir que, uma vez que apenas as barbatanas interessam, depois de mutilados os animais são jogados de volta ao mar para morrer.

Isso, por si só, já é o suficiente para nenhum ser humano querer consumir esse tipo de alimento. Mas vamos seguir. Ao que parece, a barbatana em si não tem gosto de nada, serve apenas para dar textura e consistência a um caldo de legumes ou frango. Quer mais? A medicina chinesa atribui à iguaria propriedades medicinais, enquanto estudos recentes comprovam que a carne do tubarão possui altas doses de mercúrio se comparada à de outros peixes. Então? Ficou com água na boca?!

Em Cingapura, a Cold Storage, uma das maiores redes de supermercado do país, aboliu a venda da barbatana e da carne de tubarão. Em pouco tempo, outras empresas do mesmo segmento, como o Carrefour e o Fair Price, seguiram o exemplo e retiraram os produtos de suas prateleiras. Mas ainda assim por aqui a sopa é muito popular entre os chineses. Restaurantes de luxo oferecem o prato sem constrangimentos, casais continuam o esbanjando em suas bodas e ninguém esconde a vontade de experimentar o gostinho da riqueza!

Segundo a organização Sea Shepherd, mais de 100 milhões de tubarões são abatidos todos os anos. Oito mil toneladas de barbatana são processadas anualmente, sendo que ela constitui apenas 4% do corpo do animal. Dezoito espécies de tubarão estão ameaçadas de extinção. Esse é o preço da ostentação.

Então, quando estiver viajando e se sentir tentado a experimentar a culinária local, pare e pense se aquele prato representa uma tradição que merece ser preservada ou se é apenas a herança de uma prática que há muito deveria ter sido extinta.

 Roteirista, fotógrafa e criadora da websérie 'A Culpa é do Fuso'

quarta-feira, 20 de maio de 2015

59 toneladas de tubarão em barco português

Barco português apreendido 

com tubarões pescados ilegalmente

Barco português apreendido com 59 toneladas de tubarão pescado de forma ilegal

Reuters/David Loh


A Guardia Civil espanhola apreendeu em Vigo, 59 toneladas de tubarão pescado por um barco com bandeira portuguesa. Os animais tinham as barbatanas cortadas. Uma prática proibida pela União Europeia.
Em comunicado hoje enviado à agência Lusa, aquela força policial espanhola adianta que a mercadoria apreendida pelo Serviço de Proteção da Natureza (SEPRONA) da Guarda Civil tinha como destino o mercado asiático onde as barbatanas de tubarão são muito procuradas.
"As leis comunitárias permitem o corte parcial das barbatanas para um melhor aproveitamento do espaço nos barcos. Já o corte total é proibido por poder possibilitar o arremesso, ao mar, dos corpos dos tubarões de maior dimensão, atribuindo as suas barbatanas, de grande valor, a exemplares de menor tamanho, podendo assim aumentar o número de capturas", lê-se na nota de imprensa.
De acordo com aquela força policial os exemplares foram capturados por um pesqueiro de bandeira portuguesa na Nova Zelândia, e enviados em contentores frigoríficos, num barco de mercadorias, até ao porto de Berbés, em Vigo.
Os contentores transportavam 190 toneladas de peixe, entre elas, as 59 toneladas de tubarão de várias espécies, tendo os militares envolvidos na operação contabilizado mais de quatro toneladas de barbatanas cortadas. A apreensão, segundo a Guarda Civil, "só foi possível pelo facto de a mercadoria ter sido descarregada em terra".
Os militares envolvidos na operação encontraram as barbatanas revestidas por um plástico que embalava os corpos mutilados que, por sua vez, estavam acondicionados em sacos de tela, não se podendo comprovar que se as barbatanas correspondiam aos corpos a que se encontravam unidas.
A Guardia Civil denunciou o caso ao ministério espanhol de Agricultura y Aduana, enquanto o pescado ficou à guarda da autoridade competente, em poder do proprietário.

Fonte: TSF Rádio Notícia
http://www.tsf.pt/PaginaInicial/Vida/Interior.aspx?content_id=4577417



sábado, 28 de março de 2015

Sopa de barbatanas de tubarão estão desaparecendo dos restaurantes asiáticos

Em Beijing, Xangai, Guangzhou e Chengdu, na China, 85% das pessoas afirmaram ter parado com o consumo

por José Eduardo Mendonça, do blog Planeta Urgente - Planeta Sustentável
     
Thinkstock
Tubarão-martelo
Tubarão-martelo
Já era mais do que hora. Caçados impiedosamente, com as barbatanas arrancadas e devolvidos ao mar para uma morte após longa agonia, os tubarões estão sendo ajudados pela proibição do consumo da sopa de barbatanas de tubarão em muitos países e por mudanças de atitude na Ásia, onde o hábito se disseminou com o aumento da riqueza. Elas chegam a custar U$ 400 dólares o quilo.
A carne dos animais tem baixo valor, de 20 a 250 vezes menor que o das barbatanas. O comércio delas existe de uma forma ou outra na maioria dos lugares do mundo, impactando ecossistemas, estoques de peixes e o turismo potencial ou existente. Não há informações seguras sobre o montante delas. Dados nacionais não combinam com aqueles do grande mercado importador de Hong Kong, de maneira que dezenas de milhões dos tubarões somem das estatísticas.
De volta à água, sem as barbatanas os peixes não conseguem nadar ou soltar líquido pela guelras, morrendo sufocados, por perda de sangue ou pela predação por outras espécies. Jogá-los no mar é estúpido também do ponto de vista econômico e social, já que 90% da carcaça, fonte de proteína, é jogada fora.
Tubarões estão aqui há mais do que 450 milhões de anos antes de nós. No entanto, só no último meio século destruímos 90% de suas populações.
Há falta de dados sobre taxa ou ameaça de extinção de suas espécies. São conhecidas mais de 1200 delas e de seus parentes, as arraias. A União Internacional de Conservação da Natureza disse que as ameaçadas de extinção são 17 delas. Mas a taxa é certamente muito mais alta. Os níveis de procriação são muito diversos, e algumas terão mais dificuldade de se salvar.
A crise se acentuou com o forte crescimento econômico da China e outras nações do leste asiático. Antes disso, a maioria dos asiáticos não tinha dinheiro para pagar pela iguaria.
A matança é impressionante. Muitos países da África, Ásia e Oriente Médio não estão envolvidos em tratados internacionais de proteção e conservação e, ainda que estivessem, não teriam recursos para rastrear quais espécies estão sendo mortas em grandes quantidades. Alguns, com recursos, contornam a lei e pescam ilegalmente.
Até os anos 1980 e 1990 parte do massacre mais sangrento ocorria nos Estados Unidos que, depois de terem dizimado espécies como bacalhaus, arenques, linguados , atuns e peixes espada, promoveram a exploração dos tubarões como “recurso subutilizado”.
Notícias boas começam a chegar. O comércio global de barbatanas se encontra em declínio. Nos últimos dois anos, China, Hong Kong e Malásia proibiram a sopa de barbatana em eventos oficiais. Na Ásia, cinco grandes redes hoteleiras se comprometeram a não servi-la e 26 linhas aéreas concordaram em não mais transportá-las.
Em Beijing, Xangai, Guangzhou e Chengdu, na China, 85% das pessoas que responderam a uma pesquisa recente da WildAid afirmaram ter parado com o consumo. Estados Unidos, União Européia e Índia proibiram a atividade de extirpação das barbatanas, que hoje é ilegal em 100 países.
Avanços científicos também farão diferença no caso da conservação dos tubarões. Mais dados sobre as espécies serão supridos. Conservacionistas em todo o mundo esperam ansiosos os resultados de um estudo britânico que tem o objetivo de responder se é possível rastrear espécies ameaçadas através de DNA ambiental (eDNA). Se der certo, pesquisadores poderão criar mapas globais da vida submarina. Os métodos atuais são custosos, ocupam muita mão de obra, exigem que equipes permaneçam longos períodos no mar sem garantia de conseguirem informações desejadas.
“Basicamente, todas as coisas vivas são feitas de tecido, e e se você reduzi-lo a unidades cada vez menores, acaba tendo células”, explica Stefano Mariano, da Universidade Salford, em Manchester. “Cada célula de cada organismo contém DNA. Teoricamente, é possível colocar mecanismos de arrasto na água e recolher algum DNA vindo deste ambiente”.
“Se você for por exemplo a uma floresta tropical e souber que há uma porção de onças espalhadas por centenas de quilômetros, não vai vê-las a não ser que passe meses na selva e use câmeras ocultas”, diz ele. “O mesmo se aplica a grandes animais distribuídos no oceano, como baleias e tubarões. Para vê-los e monitorá-los, o orçamento é enorme. Se tudo der certo, promoveremos uma grande mudança, porque tudo que será necessário é coletar água o bastante”.
“Os métodos atuais de identificação das várias espécies de tubarões em uma área exigem um comprometimento significativo de pessoas, tempo e dinheiro”, afirma Katie Matthews, diretora do programa de ciência ambiental da organização Pew Charitable Trusts, uma das financiadoras do estudo.
Uma pessoa, um barco e uma garrafa de água, simples assim. A água é filtrada, o DNA analisado e assim se determina quais espécies estiveram na área. Com a diminuição rápida dos custos de processamento de DNA, parece que esta ferramenta de conservação marinha vai ser cada vez mais comum no futuro.